domingo, 12 de outubro de 2008

quase-memórias

Outra crítica importante à perspectiva da memória, esta concebida por Joseph Butler (1692-1752), corre assim: as atribuições de memória (e.g., Maria recorda-se de ter estado na festa) pressupõem a identidade pessoal (Maria é a pessoa que esteve na festa), o que significa que não podemos usar a memória como critério para determinar a identidade.

A solução é substituir o conceito de memória pelo de quase-memória, que não envolve o pressuposto indicado: pode ser impossível uma pessoa recordar-se de algo que não lhe tenha ocorrido, mas qualquer um poderá quase-recordar-se de algo que sucedeu a outra pessoa. O conceito de quase-memória é um dos variadíssimos insights de Derek Parfit que fizeram de Reasons and Persons uma obra-prima absoluta, na medida em que a filosofia admite tal coisa.

Tenho uma quase-memória de uma experiência, diz Parfit, se
  1. Pareço recordar-me de ter tido a experiência;
  2. Alguém teve essa experiência;
  3. A minha memória aparente depende causalmente, de uma forma apropriada, dessa experiência.
As memórias comuns, portanto, incluem-se entre as quase-memórias, pois satisfazem as três condições. Mas um dia poderão existir quase-memórias que não são memórias.