segunda-feira, 15 de setembro de 2008

o aborrecimento como verdade

Antes de a teoria de Lewis sucumbir a uma machadada fatal num dos próximos posts, uma experiência mental muito simples poderá facilitar a apreensão do golpe.

Imaginemos David, para dar um nome ao sujeito da experiência. Há uma tômbola de dimensão desconhecida que contém uma única bola vermelha e um determinado número de bolas brancas. A bola vermelha, e nenhuma outra, dá acesso ao Prémio.

David carrega num certo botão e uma bola sai da tômbola. Teve sorte: é a boa vermelha! Mas então aparece o Demónio e diz-lhe que só receberá o Prémio se responder correctamente à seguinte pergunta: quantas bolas havia na tômbola? Para lhe facilitar a vida, o Demónio diz-lhe que há apenas três hipóteses:

  1. Dez bolas;
  2. Um milhão de bolas;
  3. Um bilião de bolas.

David sorri. Afinal o Demónio não é particularmente maldoso, dado que 1 é, com toda a evidência, a resposta razoável. Pois tirar a bola vermelha se esta fizer parte de um conjunto de apenas dez bolas não envolve nenhuma sorte notável. Pelo contrário, a verdade de 2 deixaria David numa posição muito mais extraordinária: entre um milhão de bolas, ele teria conseguido a única vermelha! E a resposta 3, se verdadeira, faria de David um jogador absurdamente afortunado.

Em suma, a resposta 1 impõe-se, pois é aquela que torna menos surpreendente o facto de David ter tirado a bola vermelha. É essa a resposta que coloca David numa posição mais aborrecida, a partir da qual a sua conquista do Prémio pouco tem de impressionante. E as probabilidades compelem-nos a admitir o aborrecimento como verdade.